A comunicação não violenta (CNV), é uma abordagem da comunicação que nos conecta conosco e com as pessoas ao nosso redor. É uma técnica que traz à tona aspectos importantes de relações saudáveis, como uma boa convivência por meio da empatia pelo outro.
A CNV é percebida há milhões de anos nas habilidade sociais e de comunicação de grandes líderes espirituais e políticos como Gandhi, Jesus, Buda, Martin Luther King e outros personagens importantes na construção da história do mundo.
Esses grandes líderes, foram, inclusive, a inspiração para o Psicólogo Marshall Rosenberg, criar a técnica na década de 60, quando a utilizava como ferramenta de orientação educacional, com o objetivo de ensinar a mediação de conflitos e a habilidade de comunicação em um ambiente de guerra civil altamente violento.
Nos dias atuais, a Comunicação Não-Violenta é uma habilidade social bastante requisitada por grandes empresas, gestores e líderes de setores de Treinamento e de Recursos Humanos das empresas.
Confira nesse artigo tudo o que você precisa saber sobre Comunicação Não-Violenta, o que é, suas aplicações e como ela pode fazer a diferença nas relações interpessoais e no sucesso das organizações.
- O que é a comunicação não violenta?
- Como e onde surgiu o conceito de CNV?
- Componentes da CNV
- Como aplicar a CNV na prática?
- Qual a importância da comunicação não violenta nas empresas?
O que é a comunicação não violenta?
Comunicação Não Violenta é uma técnica baseada em competências de comunicação e linguagem, que tem como objetivo gerar conexão e compaixão por meio da construção de um olhar mais consciente das interações sociais, bem como dos fatores que podem impactá-las.
Ou seja, quanto mais conscientes dos fatores que motivam a dificuldade em ouvir atentamente o outro e que influenciam a fala apressada e agressiva, mais chances de reformular esse cenário existe.
Segundo The Center for Nonviolent Communication, a “CNV nos ajuda a descobrir a profundidade de nossa própria compaixão” e não é à toa que, atualmente, a ela seja uma das soft skills mais procuradas por gestores e líderes dos mais diversos ramos empresariais, comerciais e acadêmicos.
Isso acontece porque se relacionar de maneira que demonstre atenção, respeito, empatia e compaixão, abre espaço para diálogos sinceros, acordos bem estruturados e soluções inteligentes para problemas que, de outra maneira, poderiam se transformar em conflitos e desentendimentos.
No que a comunicação não violenta é baseada?
A comunicação não violenta é baseada nas habilidades sociais de grandes líderes que impactaram a história e o mundo de seu tempo. São competências de comunicação e linguagem observadas, que quando aplicadas com uma técnica, auxiliam na transformação gradativa da maneira como nos comunicamos conosco e com os outros, gerando um ciclo de cura e empatia.
“Tudo o que foi integrado ao NVC é conhecido há séculos sobre consciência, linguagem, habilidades de comunicação e uso do poder que nos permite manter uma perspectiva de empatia por nós mesmos e pelos outros, mesmo sob condições difíceis.”
– Marshall B. Rosenberg, Phd
A desrobotização da fala e da escuta acontece por meio da observação consciente de fatores comportamentais que estão presentes em todas as relações e interações humanas, como:
- Consciência sobre juízos de valores pessoais;
- Autoconhecimento de sentimentos profundos;
- Capacidade de observar e perceber os sentimentos mais intensos nos outros;
- Capacidade de distinguir opiniões pautadas no intelecto das que são pautadas nas emoções;
- Habilidade diferenciar um pedidos de ameaças ou exigências;
- Entre outros.
Comunicação Não Violenta e a Escuta Ativa
A técnica da escuta ativa se faz imprescindível para a aplicação da Comunicação Não-Violenta, pois ela tem o poder de gerar o sentimento de atenção necessário para que ambas as partes sintam-se acolhidas e engajadas em ouvir e falar abertamente, construindo assim uma profunda percepção de respeito pela história do outro, o que na prática, se traduz em conexões reais e empatia.
Como se conectar com pessoas, se assumimos sempre uma postura fechada ou defensiva, sem levar em consideração a fala do outro? Por esse motivo, a escuta ativa tem como fundamento o real desejo de parar e verdadeiramente ouvir o que está sendo dito, sem implicações de juízo. É assumir uma postura ativa, aberta para o diálogo.
E é exatamente entre esse elo “ouvir e falar” que a Comunicação Não-Violenta pode ser alcançada.
Como e onde surgiu o conceito de CNV?
A Comunicação Não-Violenta, como uma metodologia teórica é uma técnica de aplicação prática desenvolvida nos anos 60 pelo psicólogo norte-americano Marshall Rosenberg.Ele teve como parâmetro de observação as habilidades sociais e condutas de resistência não-violentas, de grandes lideranças espirituais e políticas de todas as épocas, como uma resposta prática para mudar a realidade violenta em que estavam inseridos.
O próprio Rosernberg aplicou a ténica da CNV em um ambiente de luta, em um país na época incendiado por segregação racial, violência e injustiça.
Como orientador educacional dentro de uma instituição que não compactuava com a segregação, o papel do psicólogo era ensinar a Comunicação e a Resistência Não-Violenta para pessoas que enfrentavam uma dura realidade de injustiças e que ao longo de toda a vida, precisaram desenvolver uma postura defensiva em sua comunicação.
Componentes da CNV
Rosenberg por meio de suas observações e estudos conseguiu captar um ciclo de engajamento pessoal e interpessoal capaz de gerar comunicações mais assertivas. Vamos ver quais são eles.
1. Observação (sem criticar)
O primeiro componente da Comunicação Não-Violenta refere-se à habilidade de observar sem avaliar. Observar sem avaliação tem a ver com enxergar os fatos sobre si e sobre os outros ao seu redor de maneira imparcial.
Quando você observa um comportamento, costuma automaticamente incluir um juízo de valor como, por exemplo, se alguém cruzar os braços em uma conversa, você pensa “acho que ele ficou bravo” ou “achei estranho ele cruzar os braços”? Conhece alguém assim?
Se sim, é exatamente sobre essa observação-crítica que Rosenberg diz para eliminar da comunicação, porque quando nos expressamos debaixo desse tipo de observação, ainda que a intenção seja boa, soará como uma crítica.
Dale Carnegie em seu livro “Como Fazer Amigos e Influenciar Pessoas” começa demonstrando técnicas fundamentais para lidar com pessoas. Sabe qual a primeira lição? Que a crítica repele as pessoas e se queremos ser influentes e bem relacionados, é melhor deixar a crítica de lado.
A auto-observação e a observação do que ouvimos, vemos ou experimentamos nos dá consciência, e é exatamente nesse ponto que a Comunicação Não-Violenta pretende chegar, no momento em que podemos nos expressar de maneira mais imparcial, mais aberta, com mais empatia e compaixão pelo que foi observado.
“Nunca vi uma criança burra; (…) já vi criança que não conhecia as mesmas coisas que eu; mas não era uma criança burra. Antes de chamá-la de burra, pense: era uma criança burra ou apenas sabia coisas diferentes das que você sabia?” — Marshall B. Rosenberg
2. Sentimento (saber se expressar)
Sabia que nosso repertório de palavras para rotular os outros costuma ser maior do que o nosso vocabulário para descrever claramente nossos próprios sentimentos?
Segundo Rosenberg, o 2°componente da Comunicação Não-Violenta é a habilidade de expressar como nos sentimos de maneira simples e honesta.
No meio empresarial pode ser muito comum esconder os próprios sentimentos, mantendo sempre uma linguagem mais racional e lógica, não tanto emocional. Contudo, é certo que expressar nossa vulnerabilidade pode ajudar em diversas questões ligadas ao convívio social, como a resolução de conflitos.
O que sentimentos vs o que pensamos que sentimos
O grande desafio do segundo componente da CNV é desenvolver a habilidade de identificar nossos sentimentos e encontrar as palavras certas para expressá-los.
Veja as seguintes frases:
- “Eu sinto que meu chefe não me apoia”;
- “Eu sinto que meus colegas de trabalho não gostam de mim”.
Toda vez que comunicamos a alguém que “sentimos” algo seguido do “que”, na verdade estamos expressando o que pensamos sobre algo, não nossos sentimentos reais. Por isso, a expressão “sinto que” poderia ser facilmente substituída por:
- “Penso que”;
- “Creio que”;
- “Acho que”.
O que sentimos versus como achamos que os outros reagem a nós
O mesmo raciocínio se dá quando expressamos, por exemplo, “sinto que eu decepciono todo mundo”, “sinto que ninguém gosta de mim”. Para nos expressarmos de maneira clara, é preciso saber distinguir o que sentimentos do que acreditamos que os outros acham ou pensam de nós.
Aprendendo a expressar sentimentos
Para expressarmos nossos sentimentos basta sermos diretos “estou triste pelo que aconteceu” ou “me sinto irritado com essa situação”. Além disso, construirmos um vocabulário mais extenso para definirmos nossos sentimentos ajuda a nos expressarmos melhor.
Para ajudar nesse desafio, confira a lista de sentimentos abaixo:
Expressões de sentimentos positivos:
- Estou apaixonado por você
- Estou feliz com essa notícia
- Me sinto animado com esse projeto
- Estou admirado com essa paisagem
- Me sinto aliviado por ter conseguido essa vaga
Expressões de sentimentos negativos
- Me sinto triste por perder essa oportunidade
- Estou com raiva de você
- Me sinto aflito com essa situação
- Estou arrependido, me perdoa
3. Necessidades: compreender
“As pessoas não são perturbadas pelas coisas, mas pelo modo que as vêem.” — EPICTETO
O terceiro componente da CNV compreende em assumir a responsabilidade por nossos sentimentos. Isso quer dizer que ao identificarmos o que sentimos, é também necessário compreender suas motivações.
Ligando os sentimentos à necessidades escondidas
Uma maneira de identificar a motivação por trás de nossos sentimentos é ligá-los às necessidades, “sinto-me assim porque eu…”.
Exemplo: “sinto-me triste porque eu precisava daquela promoção”
Todo sentimento denota algum tipo de necessidade pessoal, alguma demanda interna como um pedido de ajuda ou de atenção, algum desejo ardente. Saber quais são essas necessidades e expressá-las de maneira clara e direta é importante e abre espaço para uma compreensão mais assertiva e por consequência, com maiores resultados.
4. Pedido: saber pedir
O quarto e último componente da Comunicação Não-Violenta trata da questão do que gostaríamos de pedir aos outros. Mas como nos expressar de maneira que nosso pedido seja atendido? Rosenberg nos dá algumas dicas com a utilização de afirmações positivas.
Quando pedimos algo a alguém é necessário expressar o que queremos, não o que não queremos. Isso tem a ver com utilizar uma fala honesta e direta. Além disso, evite usar frases vagas e ambíguas, e até o óbvio às vezes precisa ser dito com clareza.
Exemplo de uma afirmação positiva: “você passa muito tempo trabalhando, me sinto solitário, vamos passar mais tempo juntos?”
Exemplo de uma afirmação negativa, que não expressa com clareza os sentimentos, necessidades, nem o pedido: “você passa muito tempo trabalhando, deveria passar mais tempo fora do escritório…”
Como aplicar a CNV na prática?
Saber ouvir atentamente e se expressar de maneira clara é um dos maiores desafios em um ambiente competitivo como o mercado de trabalho. Por esse motivo, possuir habilidades sociais e de comunicação que resultem em solução de problemas, mediação de conflitos, compreensão entre partes e acordos bem desenvolvidos são tão procurados.
Mas como aplicar essa técnica na prática em um ambiente muitas vezes fechado para um diálogo mais emocionalmente honesto? Confira algumas dicas:
- Cultura organizacional
Um bom começo é entender qual a situação da cultura organizacional da empresa. Dessa forma, é possível identificar os motivos por trás do sentimento e comportamento dos colaboradores.
Se a cultura da empresa alimenta uma postura mais agressiva, de competitividade acirrada e não dá os recursos certos para equilibrar essa equação, se quer para os líderes, é provável que desentendimentos e dificuldades de relacionamento e bom convívio apareçam.
- Invista no Treinamento e Desenvolvimento
Por esse motivo, pensar em treinamentos começando pela liderança e gestão, é uma excelente dica. Movimentar a equipe de T & D para aplicar treinamentos com lições práticas, que simulem situações e demonstrem de maneira assertiva as técnicas de uma comunicação não-violenta e escuta ativa podem fazer toda diferença, começando pelos líderes e gestores.
- Habilite a escuta ativa
Saber ouvir é um dos pontos mais importantes para pessoas e empresas que procuram aplicar a comunicação não-violenta na prática. Por meio da escuta ativa é possível identificar de maneira consciente as nuances que permeiam cada situação, fazendo com que a comunicação seja estratégica e eficiente.
Além disso, a escuta ativa gera um sentimento de empatia e engajamento entre empresa, liderança e equipes, abrindo espaço para feedbacks mais assertivos e melhor resolução de divergências internas.
Exemplo de uma comunicação não violenta
A Comunicação Não-Violenta pode ser aplicada em todos os âmbitos da nossa vida, em nossas relações amorosas e pessoais, até no acordo de contratos e reuniões de trabalho. Veja abaixo o exemplo de um diálogo CNV.
“Renato, líder de treinamento em uma startup, pediu para sua assistente, Maitê, fazer um relatório. Maitê fez o relatório e passou para o Renato aprovar. Ao analisar o documento, Renato repara em alguns erros cometidos pela assistente e comenta no documento:
— Maitê, o relatório ficou muito bom. Preciso apenas que reveja as últimas duas páginas, o cálculo de fechamento está incorreto. Se precisar de ajuda, pode me chamar.
Maitê ao ler o comentário, fica um pouco envergonhada pelo erro cometido, revê o pontos citados por Renato, corrige os erros e responde:
— Renato, obrigada pelo feedback e pela ajuda. Acabei de revisar o documento e corrigir os erros de cálculo. Precisa de mais alguma coisa?
Renato responde:
— Tudo certo, Maitê. Por ora não preciso de mais nada, obrigado pela dedicação.”
8 Dicas para exercitar a CNV
Para desenvolver a habilidade de uma comunicação não-violenta é necessário incluir a prática como uma tarefa diária. Isso acontece porque nosso estilo de comunicação é modelado por hábitos que adquirimos ao longo de nossa vida.
Esses hábitos, tanto na maneira como ouvimos e falamos, são influenciados por nossa infância, nosso lar, nossa cidade e meios de convívio no geral.
Pessoas que passaram muitos anos em ambientes de trabalho com uma cultura mais fechada para a comunicação, por exemplo, também podem ter mais dificuldade em desenvolver uma comunicação não-violenta, justamente por associar o ambiente de trabalho a um “campo de batalha” onde é necessário “sobreviver”.
Então, se uma empresa habitualmente valoriza a honestidade, e se comunica com seus colaboradores, clientes e parceiros de maneira transparente e amigável, então esses valores começam a transparecer também no comportamento e hábitos das pessoas vinculados à ela.
Pensando nisso, vamos dar algumas dicas mais práticas de como exercitar a Comunicação Não-Violenta, independente do ambiente em que você está inserido.
- Ouça sem julgamento de “certo” ou “errado”;
- Inspire-se em pessoas, mas não se compare com elas (e nem elas com você);
- Abandone o tom acusatório;
- Na hora de passar feedbacks negativos, por exemplo, seja compreensivo e cuidadoso, procure entender o que ocasionou os erros, sem condenar a pessoa por isso;
- Na hora de mediar conflitos, expresse suas próprias vulnerabilidades, isso ajuda com que as pessoas também baixem a guarda e se direcionam para a solução;
- Antes de responder de maneira impensada a ataques, respire fundo e reflita se compensa se deixar levar, afinal, violência só gera mais violência;
- Muitos dos ataques que recebemos são vindos de pessoas que não necessariamente querem nos atingir, talvez só estejam ansiosas, aflitas ou sobrecarregadas, por isso, exercite a empatia, lembre-se que cada um tem necessidades, hábitos, culturas e pontos de vista diferentes dos nossos.
Qual a importância da comunicação não violenta nas empresas?
Segundo pesquisa feita pela World Economic Forum, a capacidade das empresas globais de aproveitarem todo potencial de crescimento de novas tecnologias é prejudicada por alguns fatores, sendo os de mais impacto:
- Lacunas de competências no mercado de trabalho local – 54%
- Incapacidade de atrair talentos especializados – 46%
- Lacunas de habilidades entre a liderança da organização – 41%
O mesmo estudo mostra que até 2025 as habilidades pessoais e em grupo que os empregadores mais visam contratar e desenvolver em suas empresas são, dentre outras:
- Liderança e influência social;
- Resiliência, tolerância ao estresse e flexibilidade;
- Raciocínio, resolução de problemas e ideação;
- Inteligência emocional;
- Solução de problemas e experiência do usuário;
- Persuasão e negociação.
Essa pesquisa é bastante útil para falar da importância da CNV para as empresas. Papéis de liderança e influência social carecem de uma comunicação livre de ruídos, honesta e direta.
A CNV é importante por diversos motivos e o bom convívio é uma das principais delas. Por muito tempo o meio empresarial foi um lugar fechado para a expressão sincera de sentimentos, como se a demonstração de vulnerabilidades naturais fosse um sinônimo de incompetência ou fraqueza.
Esse cenário, além de prejudicar as interações sociais, oprimia e reprimia sentimentos humanos como medo, insegurança, tristeza e até mesmo empolgação, fechando as portas para conexões reais dentro do ambiente de trabalho.
Como a CNV impacta o clima organizacional, na gestão de pessoas e no RH?
Nesse sentido, então, podemos elencar alguns pontos importantes que impactam o clima organizacional de empresas, gestão de pessoas e RH.
- Aumento de interações mais profundos e honestas entre colaboradores e gestores;
- Mediação de conflitos onde existe multiplicidade de ideias conflitantes;
- Aumento da empatia e diminuição de desentendimentos entre setores diferentes;
- Resolução de problemas complexos de maneira colaborativa;
- Maior assertividade ao passar instruções e informações;
- Maior compaixão e empatia ao fazer correções, revisões e conceder feedbacks;
- Aumento do encorajamento e da motivação de toda a equipe;
Conclusão
Chegamos ao fim desse texto e então, o que achou sobre a Comunicação Não-Violenta?
Com certeza, essa é uma técnica de comunicação que fará total diferença na sua vida pessoal e profissional.
Ao longo deste conteúdo, entendemos o que é a CNV, de onde surgiu a técnica, sua construção teórica, como aplicar na prática, exemplo de diálogo e sua importância para o meio empresarial.
Aproveite agora para aplicar a técnica e transformar a maneira como você se comunica e se relaciona!